As lesões na pelve da criança e do adolescente, relacionadas ao esporte, são motivo de muita preocupação e frustração para pais, técnicos e atletas, pois representam um período prolongado do atleta fora das atividades, além disso, se não tratadas de forma adequada podem afastar definitivamente o atleta, por conta de limitações de movimento e dor.
A maioria das lesões na pelve imatura ocorrem nas apófises, que são os locais de fixação dos tendões nos ossos, onde o formato ósseo é influenciado pelos estímulos de tensão a que esses locais são submetidos. A seguir, irei discursar sobre as lesões mais frequentes, apresentação clínica, diagnóstico e opções de tratamentos, baseados na literatura.
As fraturas avulsões apofisárias da pelve, são lesões que normalmente ocorrem em atletas adolescentes, podendo também acometer crianças [1]. São mais frequentes na adolescência porque nesta idade, a ossificação secundária nas apófises (locais de fixação dos tendões nos ossos) coincide com o fortalecimento hormonal induzido dos músculos [2]. As forças súbitas de grande tensão podem ser aplicadas através das unidades musculotendíneas devido à contração vigorosa do músculo ou ao alongamento passivo do músculo, especialmente durante atividades esportivas. Como as placas de crescimento cartilaginosas nas apófises dos adolescentes são mais propensas a traumas, do que as unidades dos músculos, elas podem falhar, resultando em uma fratura avulsão da pelve [3]. Os pacientes geralmente relatam uma dor aguda na região pélvica durante uma atividade [4, 5]. A dor é mais intensa durante a atividade e diminui com o repouso. O exame clínico revela sensibilidade local, limitação de movimento e edema [6,7]. As apófises podem fraturar na inserção do reto femoral na espinha ilíaca anterossuperior (EIAS), a inserção dos isquiotibiais na tuberosidade isquiática (TI), a inserção do sartório na espinha ilíaca ântero-anterior (EIAI), a inserção do tensor da fáscia lata na crista ilíaca (CI), a inserção do iliopsoas no trocanter menor (PT), ou a inserção do reto abdominal no canto superior da sínfise púbica (SP) [8-10]. (fig 1)
A quantidade dessas lesões aumentou nos últimos anos, devido a melhores técnicas de imagem musculoesquelética e uma crescente participação de atletas adolescentes em atividades esportivas competitivas [1]. No entanto, os sintomas das fraturas por avulsão ainda podem ser mal interpretados, e ocorrer demora em seu diagnóstico e tratamento, tendo os pacientes que serem submetidos a uma cirurgia mais extensa como conseqüência desse atraso. Portanto, um diagnóstico correto e oportuno é crucial para garantir o tratamento adequado. Radiografia da pelve em pelo menos dois planos deve ser realizada nos pacientes com achados clínicos típicos e uma história adequada de trauma. Em casos de radiografias não suspeitas, a ressonância magnética ou a ultrassonografia podem ser usadas para revelar a lesão [5, 7]. O deslocamento das fraturas apofisárias pélvicas é restrito pelo periósteo relativamente espesso e pela fáscia circundante em adolescentes, assim o tratamento não operatório com um programa de reabilitação guiado é considerado o tratamento de escolha em fraturas não deslocadas [1,3].
O tratamento não-cirúrgico, que consiste em analgésicos, atividades limitadas e carga parcial usando muletas por pelo menos 3 a 6 semanas, mostrou ser bem-sucedido em muitas dessas lesões [3, 13, 14, 15-17]. No entanto, o tratamento conservador em alguns casos tem um impacto negativo na saúde de curto e longo prazo em pacientes adolescentes. As complicações potenciais do tratamento conservador incluem pseudoartorse (o osso não cola), ossificações heterotópicas (formação óssea desproporcional e em abundância) e a “síndrome dos isquiotibiais”, na qual o encurtamento e a fibrose se desenvolvem na origem dos músculos isquiotibiais após as fraturas por avulsão de IT [5, 16, 18]. Essas complicações podem estar associadas à dor crônica no local da antiga fratura e à diminuição significativa da capacidade de praticar esportes [8, 15]. Portanto, em alguns casos o tratamento cirúrgico pode ser necessário.
As fraturas apofisárias representam um desafio particular para a equipe médica. Até agora, não existe diretriz baseada em evidências para o método de tratamento ideal para esses pacientes. Estudos de meta-análise foram realizados recentemente para comparar o tratamento conservador versus o tratamento cirúrgico[12]. Como resultado, foi evidenciado que a taxa de sucesso global foi maior nos pacientes que receberam cirurgia em comparação com os pacientes que receberam tratamento conservador, especialmente se o deslocamento do fragmento for superior a 15 mm, dados estes estatisticamente significantes.
Em nossa prática diária, o nosso objetivo é fazer com que o atleta tenha um retorno bem sucedido ao esporte o mais rápido possível, respeitando o tempo necessário de cicatrização dos tecidos e a reabilitação funcional do atleta. Optamos pelo tratamento cirúrgico para os caso em que o deslocamento é significativo entre os fragmentos (>15mm) e em pacientes com alta demanda funcional. Além disso, independente do tratamento de escolha (cirúrgico ou não), o paciente será submetido a intensa reabilitação fisioterápica incluindo a fase de transição para o esporte.
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